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quinta-feira, 31 de outubro de 2013

"Carta Aberta sobre a libertação de animais do Instituto Royal"



A ação que libertou animais mantidos pelo Instituto Royal, como cobaias, para fins de experimentação ganhou avassaladoramente a opinião pública, possivelmente como nunca antes no país, inclusive com repercussões internacionais. Chamou de forma ampliada a atenção da sociedade para questão altamente sensível e de nuclear apelo ético já de muito discutida na academia: a utilização de animais para pesquisa e ensino.

A percepção da redução dos animais a recursos ou objetos de estudo, denominados assim, pejorativamente, animais de laboratório, o que se dá seja por meio de imagens bizarras, já divulgadas há tempos e de fácil acesso, seja pela literatura ou regulações, causa choque e tensiona o senso comum, demonstrando que esta cultura se vê problematizada, confrontada, quando não com a legalidade, com a moralidade, gerando um sentimento crescente de indignação.

Todavia, o Instituto Royal é uma de muitas outras entidades que usam animais como meios, estando acompanhado de diversas instituições de ensino superior, inclusive entre as mais prestigiadas Universidades brasileiras, gozando de financiamento público, sob o beneplácito da legislação, a qual autoriza que animais sejam confinados, feridos, adoentados, alienados das suas propensões naturais, da busca de bem-estar, vivisseccionados, eutanasiados, mortos.

Os animais que estavam no Instituto Royal e que estão presos em lugares similares são sencientes e conscientes, possuem uma experiência subjetiva de ser e de estar no mundo, ostentam psique, perseguem a própria felicidade, sentem medo, solidão, estresse, dor; enfim, possuem vontades. Disto testemunha a recente Declaração de Cambridge (The Cambridge Declaration of Consciousness), datada de julho de 2012, firmada por cientistas de instituições

como a Universidade de Stanford, o Massachusetts Institute of Technology (MIT) e o Instituto Max Planck, redigido por Philip Low, em evento que contou com a presença de Stephen Hawking.

Animais são dotados de interesses, interesses que encontram paralelo com interesses humanos: em síntese, o interesse de não sofrer, o interesse pela própria vida. E, portanto, não há razão para não levar tais interesses em conta, devendo-se adotar, como imperativo ético, a igual consideração de interesses.

Conclusão advinda deste reconhecimento é que animais são titulares de direitos (à vida, à integridade física, à liberdade) e não coisas. São fins em si, não são meros meios para objetivos humanos ou mesmo de outros animais. São indivíduos, insubstituíveis; são sujeitos de direitos e não objetos. Animais não são agentes biológicos, como se diz em jargão. A ética a reger a conduta, neste âmbito, deve ser, pois, em tudo, similar à ética adotada para com seres humanos, vez que a uma posição igual deve ser dispensado tratamento igual.

A existência de lei em sentido contrário não tem o condão de tornar moral o que não é. A lei, como consabido, não é necessariamente fonte de legitimidade. Pode ser injusta, pode estar errada. Esteve muitas vezes ao longo da história: quando usurpou direitos dos negros, das mulheres, dos índios e de tantos outros. Estamos testemunhando mais um movimento pela expansão de direitos: agora aos animais. O melhor cenário é quando o Direito acompanha, pari passu, tais movimentos. Por vezes, porém, há um hiato e atos ilegais/criminalizados no passado passam a ser celebrados no futuro. As insurreições contra a escravidão negra, os quilombos, são um exemplo. Quando há um contratempo entre o Direito e os direitos, vê-se a invocação do direito de resistência/desobediência civil/legitima defesa de terceiro.

Por outro lado, a própria coerência interna do ordenamento jurídico é posta à baila. Enquanto a Constituição veda condutas que implicam crueldade aos animais, enquanto a Lei 9.605/98 tipifica o crime de maus-tratos, como entender lícitas as práticas que impõem sofrimento aos animais em nome da ciência? Não são cruéis? Não são maus-tratos? Como não concluir que a Lei 11.794/08, que regula a instrumentalização dos animais em nome da ciência, não

está em conflito com a Constituição, inconciliável com a vedação de maus-tratos. Ora, se não há maus-tratos, se não existe crueldade, por que não realizar tais experimentos diretamente com seres humanos, o modelo ideal (humano-humano ao invés de humano-animal)?

A relação de igualdade é antes moral do que fática. Daí a alteridade. Não bastassem os argumentos metodológico-científicos que condenam experiências com animais para efeitos em humanos, o debate acerca da utilização de animais é antes uma discussão ética do que técnico-científica. Livres e iguais é uma bandeira central dos direitos humanos. Obviamente, os animais não são iguais em tudo aos seres humanos. Mas, no que são, devem ser assim admitidos. Mesmo não sendo iguais em tudo, são livres. Devem, pois, ser livres da opressão, da instrumentalização que parcela da humanidade impõe, subjugando-os.

Como alertou Philip Low: “Não é mais possível dizer que não sabíamos.” Assim, sendo simplesmente inaceitável, insuportável compactuar com a exploração dos animais, os signatários abaixo se manifestam contra qualquer pesquisa/teste com animal que importe fazer dele meio para outro(s).

Em 28 de outubro de 2013.

Documento em 7 páginas
Fábio Corrêa Souza de Oliveira
Prof. da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ
Prof. da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro/UNIRIO
Prof. do Mestrado em Direito, Democracia e Sustentabilidade da IMED/RS
Coordenador do Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade Estácio de Sá
Centro de Direito dos Animais, Ecologia Profunda/UFRJ-UFF-UFRRJ
Daniel Braga Lourenço
Prof. da Faculdade de Direito da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro/UFRRJ
Prof. da Pós-Graduação em Direito Ambiental da PUC/RJ
Prof. do Programa BAILE da Pace Law School (Estados Unidos)
Centro de Direito dos Animais, Ecologia Profunda/UFRJ-UFF-UFRRJ
David N. Cassuto
Prof. de Direito Ambiental da Pace Law University (White Plains, EUA)
Lenio Luiz Streck
Prof. da Faculdade de Direito da Universidade do Vale dos Sinos (UNISINOS)
Prof. do Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade Estácio de Sá
Prof. Visitante da Universidade de Coimbra e da Universidade de Lisboa
Prof. Visitante da Universidad Javeriana (Bogotá)
Carlos Naconecy
Pesquisador do Oxford Centre for Animal Ethics
Mestre e Doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do RS/PUC-RS
Laerte Fernando Levai
Pesquisador do Grupo de Ética e Direito Animal do Diversitas da Universidade de São Paulo
Prof. da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo/MP-SP
Fernando Araújo
Profa. Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa/FDUL
Fernanda Luiza Fontoura de Medeiros
Profa. da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do RS/PUC-RS
Profa. do Mestrado em Direito e Sociedade da UNILASALLE/RS
Presidente do Instituto Piracema
Rita Leal Paixão
Diretora do Instituto Biomédico da Universidade Federal Fluminense/UFF
Profa. do Programa de Pós-Graduação em Medicina Veterinária da UFF
Profa. do Programa de Pós-Graduação em Ética Aplicada, Bioética e Saúde Coletiva da UFF/UFRJ/FIOCRUZ/UERJ (PPGBIOS)
Centro de Direito dos Animais, Ecologia Profunda/UFRJ-UFF-UFRRJ
Vicente de Paulo Barretto
Decano da Faculdade de Direito da Universidade do Vale dos Sinos (UNISINOS)
Prof. do Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade Estácio de Sá
Prof. Aposentado da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro/UERJ
Larissa Pinha de Oliveira
Profa. da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ
Centro de Direito dos Animais, Ecologia Profunda/UFRJ-UFF-UFRRJ
Paula Callefi
Reitora da Universidade Estácio de Sá/UNESA
Doutora em Historia pela Universidad Complutense de Madrid
Carlos Bolonha
Prof. da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ
Vice-Diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ
Maria Clara Marques Dias
Profa. do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ
Profa. do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da UFRJ
Profa. do Programa de Pós-Graduação em Bioética, Ética Aplicada e Saúde Coletiva da UFRJ/UERJ/UFF/FIOCRUZ (PPGBIOS)
Coordenadora do Núcleo de Inclusão Social da UFRJ/NIS-UFRJ
Centro de Direito dos Animais, Ecologia Profunda/UFRJ-UFF-UFRRJ
Tagore Trajano
Presidente do Instituto Abolicionista Animal/IAA
Mestre e Doutor em Direito pela Universidade Federal da Bahia/UFBA
Julio Dornelles Goulart
Prof. da Faculdade de Direito das Faculdades Hélio Alonso/FACHA (RJ)
Danielle Tetü Rodrigues
Prof. da Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica do PR/PUC-PR
Vice-presidente do Instituto Abolicionista Animal/IAA
Cristiane Dupret
Profa. da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ
Profa. da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro/EMERJ
Profa. da Faculdade de Direito Universidade Estácio de Sá/UNESA
Jaime Nudilemon Chatkin
Promotor de Justiça do Rio Grande do Sul/MP-RS
Heron José Gordilho
Prof. do PPGD da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia/UFBA
Reynaldo Velloso
Presidente da Comissão de Proteção e Defesa dos Animais da OAB/RJ
Advogado e Biólogo
Ana Paula Perrota
Doutoranda em Antropologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ-IFCS
Marcelo Dealtry Turra
Prof. da Faculdade de Direito das Faculdades Hélio Alonso/FACHA (RJ)
Coordenador do Escritório de Prática Jurídica das Faculdades Hélio Alonso/FACHA (RJ)
André TANIA KARAM Trindade
Coordenador do Mestrado em Direito, Democracia e Sustentabilidade da IMED/RS
Luigi Bonizzato
Profa. da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ
Sérgio Augustin
Coordenador do Mestrado em Direito Ambiental da Universidade de Caxias do Sul/UCS
Cristiano Pacheco
Mestre em Direito pela Universidade de Caxias do Sul/UCS
Membro da Comissão de Direito Ambiental da OAB/RS
Tiago Fensterseifer
Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul/PUC-RS
Defensor Público do Estado de São Paulo
Ruy Samuel Espíndola
Prof. da Escola da Magistratura de Santa Catarina/EMESC
Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC
Eduardo Manuel Val
Prof. da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense/UFF
Prof. do Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade Estácio de Sá
José Ribas Vieira
Prof. da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ
Prof. Aposentado da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense/UFF
Prof. da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro/PUC-RJ
Afranio Faustino
Prof. da Faculdade de Direito da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro/UFRRJ
José Roque Junges Prof. e Pesquisador em Bioética e Saúde Coletiva Prof. da Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Universidade do Vale do Rio dos Sinos/UNISINOS
Terla Bica Rodrigues
Pedagoga e Advogada
Diretora Executiva do Instituto Piracema
Mery Chalfun
Profa. da Universidade Castelo Branco/UCB
Mestre em Direito pela Universidade Estácio de Sá/UNESA
Centro de Direito dos Animais, Ecologia Profunda/UFRJ-UFRRJ-UFF
Elis Cristina Uhry Lauxen
Mestranda em Direito pela Universidade do Vale dos Sinos/UNISINOS
Membro do Núcleo de Direitos Humanos da UNISINOS
Rogério José Bento Nascimento
Prof. do Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade Estácio de Sá
Prof. da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro/PUC-RJ
Edna Raquel Hogemann
Profa. da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro/UNIRIO
Profa. do Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade Estácio de Sá
Fabio Alves Gomes de Oliveira
Doutorando em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ
Pesquisador do Núcleo de Inclusão Social - NIS/UFRJ
Eduardo Garcia Ribeiro Lopes Domingues
Prof. da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro/UNIRIO
Bruno Müller
Doutorando em História pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro/UERJ
Vânia Rall
Pesquisadora do Grupo de Ética e Direito Animal do Diversitas da Universidade de São Paulo
Paula Cals Brügger Neves Profa. do Centro de Ciências Biológicas da Universidade federal de Santa Catarina/UFSC
Fernando Augusto da Rocha Rodrigues
Prof. do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ
Aluisio Gonçalves de Castro Mendes
Prof. da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro/UERJ
Prof. do Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade Estácio de Sá